9 de maio de 2009

Quando as mães se tornam filhas

Por: José Luiz Teixeira

Entre os ritos de passagem que temos de atravessar para nosso crescimento, talvez o mais difícil e doloroso seja aquele em que nós, filhos homens, passamos a cuidar das mães como se fossem filhas.
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Pode ser preconceito de minha parte, o que não seria de se admirar, mas acho que as mulheres têm mais facilidade para aceitar e cuidar de suas progenitoras quando elas se tornam idosas e, tal qual benjamins buttons, voltam a ser crianças.
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É provável que por questões edipianas aos homens seja mais difícil cuidar das mães, enquanto as mulheres talvez sofram um pouco mais ao assistir aos pais nos seus derradeiros dias.
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A verdade é que é difícil aceitar a condição que nos impõe a natureza, a partir de uma certa idade, de passarmos de cuidado a cuidador.
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O processo às vezes é demorado e, por isso mesmo, mais avassalador.
Começa com simples recomendações, do tipo "é melhor tirar esses tapetes do caminho, pois a senhora pode cair e se machucar".
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Passa por broncas severas tais como "quem mandou sair de noite com esse frio?"
Depois de alguns anos, acabamos nos resignando à nova e cada vez mais precária situação e nem ralhamos mais; simplesmente marcamos a consulta, levamos ao médico e, quando podemos, colocamos uma empregada para tomar conta - o que geralmente é motivo de resistência e implicância.
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Mais tarde, é preciso substituir a empregada por uma cuidadora ou enfermeira permanente, pois o banho e a troca das fraldas precisam ser terceirizados.
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A partir daí, transformam-se em nossos bebês - com a diferença de que em vez da vida, têm a morte toda pela frente.
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No fundo, creio que os homens sofrem mais nesses casos pela perspectiva de perder o referencial materno.
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Desde criança esse sempre foi meu maior temor. Quando minha mãe viajava a trabalho e me deixava alguns dias sozinho com meu pai, rezava todas as noites pedindo a Deus que a conservasse viva por muitos e muitos anos.
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Chorava ao ouvir no rádio uma música do cantor gaúcho Teixeirinha, que tocava insistentemente, na qual ele narrava o episódio em que ficou órfão, ainda menino, devido a um incêndio na casa em que moravam. Não lembro o nome da canção. Só me recordo que maldosamente a chamavam de "churrasquinho de mãe".
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Enfrentar o ocaso materno pode ser sintoma de imaturidade, acredito; mas conforta-me saber que estou bem acompanhado nesse "gap" psicológico.
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Outro dia, ninguém menos do que José Saramago narrava seu sofrimento por não saber lidar com a velhice da mãe.
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E contava que Fernando Pessoa também descrevera sentimentos semelhantes por sua querida Maria Madalena.
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Imagino que essa fraqueza seja típica dos latinos, principalmente portugueses e italianos, de quem descende este velho blogueiro.
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Na minha família, na qual as mulheres são admiravelmente longevas, muitos primos morreram anos antes de suas mães.
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Sou capaz de apostar que inconscientemente programaram a despedida prematura para se safar desse desagradável rito.